quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

escassez

A tradução de "crescimento econômico" baseado em recursos

originalmente submetido por Dirk-Jan van de Ven,
publicado em inglês no blog thezeitgeistmovement, 

[[ minha tradução livre, com algumas adaptações]]:



Economistas clássicos usualmente fazem alegações de que o vasto crescimento econômico é principalmente resultado da aplicação do sistema de mercado como concebido por Adam Smith já por volta de 1800, seguido pelo sistema monetário específico introduzido durante o século 20. Como argumento, eles mostram que os níveis de crescimento em termos de PIB foram muito mais elevados depois de 1800 do que antes, implicando um aumento significativo de "bem-estar" devido ao sistema de mercado.

Embora, para começar, o uso do PIB como medida do bem-estar seja uma suposição falsa, até mesmo a aceleração das taxas de crescimento do PIB não pode ser atribuída ao sistema de mercado por si só, pelo menos não a parte importante do crescimento que não se baseia em puro desperdício. Na verdade, os valores do PIB ao longo do tempo são quase perfeitamente proporcionais ao consumo de energia efetiva ao longo do tempo. Como energia efetiva, me refiro simplesmente ao valor calórico de toda a energia consumida multiplicada pela eficiência de conversão tecnológica para transformar essa energia em parâmetros úteis, tais como movimento, luz e calor utilizável.

Assim, para calcular a quantidade de bem-estar material de uma determinada sociedade, poderiamos muito bem estimar a quantidade total, ou o estoque de energia que esta sociedade poderia consumir. Mas que processos são usados ​​para as sociedades obterem energia? O primeiro passo é obter energia calórica simples do sistema natural (da natureza). Dependendo das formas de energia necessárias que o sistema precisa gerar (madeira, alimentos, combustíveis fósseis, energia eólica, etc), existem diferentes esforços em investimento necessários para obter tais calorias e watts do sistema natural. Tais esforços poderiam muito facilmente serem traduzidos em investimentos na extração de energia. O segundo passo é converter esta energia calórica em energia efetiva. Visto que a eficiência deste processo depende do estado da tecnologia (a eficiência de converter alimento em massa corporal depende do corpo humano, que na verdade reflete o "estado da tecnologia" corrente da evolução darwinista).

Assim, existem duas eficiências diferentes que, juntas, determinam o estoque de energia efetiva que pode ser usada em uma sociedade: uma que determina os custos de energia efetiva extraída do sistema natural e outra que determina os benefícios da energia efetiva que são ganhos por conversão do estoque de energia extraída. Visto que, de fato, através de muitas gerações e espécies, as fontes mais "fáceis" de energia são sempre extraídas primeiro [carvão, petróleo, etc] - deixando os recursos mais difíceis e caros para consumo posterior - os custos de extração de energia sobem - exponencialmente - junto com o montante total de investimentos em extração. A figura abaixo dá uma visualização gráfica de todo o processo para obtenção de energia efetiva.


Como pode ser visto na figura, em qualquer estoque de recursos limitados, há um determinado máximo para a quantidade de energia que qualquer sociedade poderia efetivamente extrair do sistema natural. Este limite máximo é dado pela eficiência da conversão. Este processo se produz não só às sociedades humanas, mas para quaisquer espécies no mundo natural. O balanço entre a quantidade de energia que está disponível para consumo (o estoque de energia), e a energia efetivamente convertica/consumida, determina o sucesso evolucionário da espécie. Se, por exemplo, os investimentos em energia necessária para um predador capturar uma presa tornam-se maiores do que o valor energético da alimentação oferecido pela presa, multiplicado pela eficiência de conversão do corpo do predador, o predador vai morrer, pois não há mais energia efetiva para consumir. Outro exemplo é o urso panda, que tem uma eficiência de conversão muito baixa no corpo para o processamento de bambu..., mas uma vez que esta é a única espécie que come uma quantidade significativa de bambu, os investimentos em energia para a obtenção de energia utilizável são baixos o suficiente para ele se manter vivo, apesar da eficiência do corpo ser muito baixa (mas a conseqüência é que pandas gastam cerca de metade do total de sua vida comendo bambu).


Uma análise e comparação dos custos de extração de energia e a eficiência de conversão no Reino Unido mostra que por volta de 1800, a eficiência de conversão de carvão em energia mecânica finalmente ultrapassou a média dos custos de extração de energia de carvão. Este processo tecnológico de transformação de carvão em energia mecânica já estava em processo há alguns séculos e começou muito antes da teoria de Adam Smith, publicada no "Riqueza das Nações" (1776). Desde 1800, a eficiência de conversão de carvão em energia mecânica [e, posteriormente, também a energia elétrica] aumentou mais e mais, criando um enorme estoque de energia que pôde efetivamente ser extraída de depósitos de carvão. Outros países europeus e ocidentais copiaram a tecnologia britânica do carvão transformado em energia mecânica e seguiram o mesmo processo de crescimento econômico rápido após o exemplo britânico.

No início do século 20, no entanto, o “carvão fácil” da Europa Ocidental foi quase esgotado, causando uma série de tensões para os demais depósitos. Pois a maioria deles ficava na zona fronteiriça entre a Alemanha e a França, assim a guerra na Europa Ocidental era inevitável, visto que cada país foi forçado a manter a sua economia e precisava de energia de carvão para fazer isso. Devido aos fartos subsídios do governo [nota: início dos grandes endividamentos] para desenvolvimento tecnológico durante as guerras, a eficiência de conversão de combustíveis fósseis em energia mecânica e elétrica aumentou muito, deslocando-se drasticamente a linha de eficiência de conversão do gráfico para cima. Isso fez com que fosse energicamente possível transportar combustíveis fósseis de todo o mundo para qualquer lugar onde ocorresse o consumo (porque navios de carga eram agora potentes o suficiente devido a um aumento da eficiência de conversão de seus motores), transferindo os custos de energia da linha de extração para a direita. Ambos os efeitos juntos, criaram um estoque ainda maior de energia efetivamente extraível do que nunca antes.



Esses efeitos podem ser conferidos no gráfico acima, comparando com a versão anterior do gráfico, fica claro como o deslocamento para cima da linha de eficiência de conversão e o deslocamento para a direita dos custos, aumentaram a área azul claro na figura. Visto que o consumo de energia efetiva ocorre a partir do lado esquerdo da área azul claro (pois aí está a energia mais facilmente extraível na natureza), a linha vermelha desloca um pouco para a direita a cada unidade de energia não renovável que é extraída, deixando a área azul claro restante para as gerações futuras. A visualização desta conseqüência do consumo de energia não-renovável é dado no gráfico abaixo.



Assim, durante um período de tempo, o deslocamento para cima da linha azul efetivamente aumenta a quantidade total de energia que pode ser consumida sem a necessidade de extrair mais energia. Este aumento não tem nada a ver com o sistema de mercado, mas é puramente o resultado do progresso tecnológico.

No entanto, o que o sistema de mercado, tal como proposto por Adam Smith implica é que cada indivíduo deve tentar maximizar sua própria renda, e, portanto, sua parcela no consumo de energia. Assim, no sistema atual, qualquer investimento que pode ser transformado em lucro monetário será implementado, independente de oferecer qualquer valor real para a sociedade ou não. Todo o investimento em dinheiro, em fim, é proporcional a um investimento de energia efetiva que deve ser abrangido pela extração de mais energia. Além disso, visto que a dinâmica do mercado acaba incentivando as empresas a usarem tecnologias energeticamanente ineficientes [pois o que importa é o lucro final e não a eficiência energética do processo], a linha azul de eficiência de conversão, que é dependente do estado da tecnologia aplicada, é constantemente pressionada para baixo. Este efeito causa uma necessidade de investimentos em energia ainda mais calórica do que realmente necessário com o estado atual da tecnologia. Assim, a implementação do sistema de mercado de fato leva a um maior crescimento do PIB e, assim, um crescimento da quantidade de energia consumida, mas não a um aumento da quantidade de PIB por unidade de energia extraída. E ainda, o sistema dá incentivos para mais desperdício de energia não renovável com consequências irreversíveis para as futuras gerações e com graves prejuízos para o mundo natural em que vivemos.

Em combinação com o sistema monetário, o sistema de mercado vai ainda mais longe do que apenas dar incentivos para o desperdício de energia efetiva. Como qualquer economia de mercado moderna seria prejudicada se os seus cidadãos parassem de consumir coisas que são praticamente desnecessárias para manter o seu verdadeiro nível de bem-estar - com o desemprego e as tensões sociais, como resultado, uma vez que a pressão de pessoas com dívidas não permitiriam trabalhar menos horas por menos de renda - o sistema é realmente dependente de desperdício de energia efetiva, com custos às futuras gerações (mesmo quando só a energia renovável seja utilizada, os materiais e processos utilizados nos produtos ainda estão sujeitos a forte degradação ambiental).

Usando um grande conjunto de dados, foram analisados os ganhos de eficiência e custos de conversão de energia efetiva de extração para o Reino Unido e dos EUA de 1750 até 2000. Comparando-os mostra que ambos os países passaram por caminhos idênticos nos níveis de eficiência desde o início da revolução industrial (no Reino Unido por volta de 1800, nos EUA por volta de 1850) até a crise do petróleo na década de 1970. No entanto, após a crise do petróleo é fácil distinguir caminhos diferentes para os dois países: enquanto o Reino Unido (que possivelmente é um bom exemplo para a economia média europeia), manteve o foco no aumento da eficiência de conversão média (deslocamento da linha azul), que já aumentou drasticamente desde a 2 ª Guerra Mundial em ambos os países, o aumento da eficiência de conversão média nos EUA ficou estagnado desde a crise do petróleo. Para manter seu crescimento econômico, os EUA pareciam concentrar-se drasticamente na redução dos custos de extração de energia (deslocando a linha verde para baixo / à direita), que pode ser feito mudando de petróleo e gás para energia mais suja, mas de mais fácil extração – o carvão, mas também por ganhar o controle sobre as reservas do "petróleo fácil" em todo o mundo e utilizar esse petróleo para consumo doméstico, deixando o óleo mais caro no mercado para outros países.


Existe uma correlação claramente visível e lógica entre o foco na redução dos custos de extração de energia e a quantidade de violência em todo o mundo. O melhor método (e em épocas pré-industriais, o único método) para diminuir seus custos de extração de energia, é controlar as áreas no mundo que são tão produtivos quanto possível para utilização agrícola ou áreas que contêm os recursos mais valiosos. Obviamente, uma vez que estas áreas são escassas, esta disputa provoca tensões entre diferentes sociedades, visto que todos querem desfrutar do mais alto nível de bem-estar possível. Desde a existência de sociedades agrícolas, houveram várias grandes e pequenas guerras, aumentando em número juntamente com o montante total de pessoas que vivem neste planeta. Olhando as fronteiras da Europa durante os últimos 2000 anos, pode-se ver limites constantemente deslocados, pois havia quase sempre alguma guerra acontecendo em algum lugar na Europa. O processo de deslocamento das fronteiras na Europa no entanto diminuiu desde a revolução industrial e parou completamente após a 2 ª Guerra Mundial. A razão para isso é facilmente visível no gráfico acima de energia efetiva: como a eficiência de conversão triplicou desde a segunda guerra mundial, a quantidade de energia necessária para a extração perde significado na maximização da quantidade total de energia efetiva disponível para o consumo. O foco americano na redução dos custos de extração de energia após a crise do petróleo pode voltar a ser facilmente relacionado com uma série de guerras no mundo, principalmente nas partes que contêm a maior quantidade de recursos valiosos.

Ao todo, o nosso desejo é criar um mundo que é tão pacífico e sustentável quanto possível, devemos nos concentrar em maximizar o lado vertical do espaço energético efetivo no gráfico acima, e não sobre o consumo de energia horizontal efetivo [ou simplesmente aumentar a eficiência de conversão - elevando a linha azull, minimizando porém os efeitos da extração na natureza]. Em outras palavras, um sistema deve ser adotado que dê incentivos para se obter o máximo de energia efetiva o possível para cada unidade investida em extração de energia. Ao mesmo tempo, deve punir qualquer extração de energia que não seja necessária para manter o verdadeiro nível de bem-estar da sociedade.

A história parece repetir-se em diferentes épocas..., como era ha cerca de 100 anos atrás, onde uma crescente escassez de carvão causou várias guerras na Europa, nos últimos anos vemos os preços do petróleo subindo rapidamente, o que fornece um claro sinal de que o petróleo está se esgotando, levando a enormes tensões internacionais sobre os campos de petróleo restantes. Na era anterior, dominada pela teoria do mercado, estes tipos de tensões causaram duas guerras enormes. Esperançosamente poderíamos simplesmente evitar essas guerras na idade atual e gastar nossos recursos para o desenvolvimento tecnológico e para as mudanças estruturais necessárias, sem a necessidade de todos os incentivos para os governos que ironicamente foram causados pelas guerras sobre os recursos restantes durante a época anterior.



fonte original (em inglês):
[http://blog.thezeitgeistmovement.com/blog/dirk-jan-van-de-ven/resource-based-translation-economic-growth]

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