domingo, 5 de fevereiro de 2012

voto distrital, pura distorção!


<<Por várias razões, o voto distrital está longe de ser uma solução. Nele, é possível que quase a metade de uma região, estado ou do País fique sem representação. E é certo que, para as minorias étnicas, religiosas, culturais, de gênero ou opinião, entre outras, seria quase impossível eleger deputados.>>

[Marcos Coimbra – sociólogo e presidente 
do Instituto Vox Populi, para o site da revista Carta Capital]

- - - - - - - - - - - - - - - -

Existe atualmente em curso no país uma campanha amparada por banqueiros, grandes empresas, políticos e meios de comunicação a favor da adoção do sistema de voto distrital. Alegam que tal sistema eleitoral (de maioria simples) deveria ser adotado Brasil. No entanto, apesar de –- à primeira vista -- tal sistema aparente ser melhor, pois é mais simples e direto (os eleitores votariam diretamente no nome dos candidatos, e os mais votados seriam os eleitos em cada distrito), seu funcioamento esconde vários defeitos e sérios problemas, os quais tentarei mostrar abaixo, a partir de algumas publicações e textos que exclarecem melhor a questão.



[fonte imagem: http://www.aldeiagaulesa.net/2011/09/os-equivocos-do-voto-distrital.html]

- - - - - - - - - - - - - - - -

[a aprtir do verbete “voto distrital” da wikipedia]:


O voto distrital é, na mídia e nos meios políticos brasileiros, sinônimo de sistema eleitoral de maioria simples. Esse é um sistema em que cada membro do parlamento é eleito individualmente nos limites geográficos de um distrito pela maioria dos votos. Para tanto, o país é dividido em determinado número de distritos eleitorais, normalmente com população semelhante entre si, cada qual elegendo um dos políticos que comporão o parlamento.

[Aqui já se verifica um grande problema. Como efetivar tal divisão distrital num país tão heterogêneo e imenso como o Brasil? Note que o distrito não é um município, nem um estado federativo, mas sim um agrupamento independente, que seria feito somente para mérito eleitoral. O texto "Os equívocos do voto distrital" do sociólogo Marco Coimbra para o site da revista Carta Capital elabora melhor esta problemática -- ver abaixo]

Há uma crescente pressão por mudança nos países que adotam o sistema de voto distrital, como a Inglaterra. Nos Estados Unidos, onde o movimento fair vote defende a representação proporcional, vários estados promoveram reformas nos sistemas eleitorais, mas há preferência pelo sistema majoritário em escala federal. No Brasil democrático, o sistema distrital não teve defensores significativos até 1993. O projeto que defendia a adoção do sistema foi derrotado ainda na fase das subcomissões na constituinte de 1988.

O voto distrital pode ser realizado por diversos sistemas de votação; os mais comuns são por maioria simples (caso dos EUA e Reino Unido) e por maioria absoluta (caso da França), no qual a votação pode ser feita em dois turnos.

Os especialistas consideram o sistema eleitoral de maioria simples (de um ou dois turnos) problemático por diversas razões. Em primeiro lugar, o sistema distorce as escolhas partidárias de seus eleitores e promove o desperdício de votos. Em segundo lugar, ele reduz severamente a quantidade de opções partidárias dos eleitores. Por fim, o sistema não é capaz de promover a igualdade geográfica que propõe.

Como exemplo, veja o diagrama abaixo das eleições da Inglaterra. Pode-se verificar que o sistema de voto distrital é altamente desproporcional. 





O diagrama mostra a discrepância entre a proporção total de votos obtidos pelos partidos britânicos (parte interna) e o número de assentos que eles assumiram no parlamento (parte externa) nas eleições gerais de 2005.


- - - - - - - - - - - - - - - -

Os equívocos do voto distrital


Texto publicado por Marco Coimbra, no site da revista Carta Capital, em 17/set/2011
[http://www.cartacapital.com.br/politica/os-equivocos-do-voto-distrital/]


Vamos imaginar que, por qualquer razão, a campanha que a direita brasileira move por meio de seus jornais e revistas em favor do voto distrital dê certo. E que, com a mesma irresponsabilidade com que tem sido propagandeado, o Congresso resolva aprová-lo.

As pessoas que foram convencidas pelos argumentos de políticos, jornalistas e intelectuais conservadores se sentiriam bem. Para elas, com o fim do voto proporcional, teríamos dado um grande passo para consertar as deficiências de nossa democracia.

Estariam enganadas.

Acreditaram que ele não tinha contraindicações e que era simples implantá-lo. Mas a verdade é que o voto distrital traz vários problemas e é difícil adaptá-lo à nossa cultura.

A primeira pergunta é quantitativa: quantos distritos haveria no Brasil? Alguns dizem que seriam 513, o número de deputados federais existentes. Mas, nas eleições para as Assembleias, qual seria o número? Os deputados estaduais são 1.059 (incluídos os distritais). Haveria municípios agrupados na eleição para a Câmara, mas separados na estadual?

Teríamos, também, de concordar com o tamanho dos distritos. No ano passado, éramos 135,8 milhões de eleitores. Se fossem 513 distritos, a média seria de perto de 265 mil eleitores em cada um.

Nos países com voto distrital, a praxe é fazer essa conta, aplicando o princípio de “cada cabeça, um voto”. Quando são federativos (como os Estados Unidos), procura-se, no entanto, corrigir a eventual falta de representação dos estados pequenos, assegurando que tenham ao menos um distrito.

Aplicando o princípio e supondo que ficaríamos com 513 distritos (pois seria pouco provável que a sociedade apoiasse o aumento do número de deputados), todos os estados teriam sua representação diminuída, à exceção de São Paulo (onde ela quase dobraria).

Há que pensar no que são distritos com 265 mil eleitores. Como imaginar que neles haveria a propalada proximidade entre representantes e representados? Alguém pensa, a sério, que deputados eleitos com base em territórios tão complexos e heterogêneos estariam “perto” dos eleitores? Que aumentaria a possibilidade de serem cobrados?

E onde começariam e terminariam os distritos recém-criados? O bairro tal ficaria junto de quais outros? A cidade A seria do distrito X ou Y? As microrregiões hoje reconhecidas administrativamente seriam mantidas?

Essas perguntas estão na base do que os norte-americanos chamam de apportionment: a necessidade de calcular e, periodicamente, recalcular o número de distritos dos estados e a combinação de localidades dentro deles, de forma a que reflitam as mudanças demográficas.

É um processo cheio de complicações e possibilidades de manipulação. A ponto de terem inventado uma palavra para designar a procura de vantagens individuais ou partidárias ao fazê-lo. O nome é gerrymandering e ocorre com frequência por lá.

Se, então, o Congresso aprovasse o voto distrital no Brasil, o que teríamos de imediato seriam novos problemas. Em vez de consertar nossos males, criaríamos outros.

Tudo valeria a pena se houvesse certeza da superioridade do voto distrital em relação ao proporcional. Nos aborreceríamos até chegar a ele, mas o resultado compensaria.

Não é, no entanto, o caso.

Por várias razões, o voto distrital está longe de ser uma solução. Nele, é possível que quase a metade de uma região, estado ou do País fique sem representação. E é certo que, para as minorias étnicas, religiosas, culturais, de gênero ou opinião, entre outras, seria quase impossível eleger deputados.

A disputa de votos baseados na territorialidade faz com que o conteúdo político das candidaturas fique em plano secundário. O que predomina é a discussão dos “problemas concretos” e de quem tem “mais capacidade” de resolvê-los. O típico eleito é (e se orgulha disso) um “despachante de luxo”, um parlamentar paroquial que vai para Brasília com a ideia de que só deve explicações à sua região. Isso já existe hoje, e se generalizaria e se intensificaria.

No voto distrital, os candidatos não precisam de seu partido para se eleger. Só sua votação conta. Sentem-se, portanto, donos exclusivos de “seus” votos. Estar filiado a determinado partido chega a ser irrelevante.

Complicado, sujeito a manipulações, o voto distrital é ruim na representação de minorias, leva à falta de ideologia na política e enfraquece os partidos.

Talvez sejam seus problemas que atraiam a direita. Ou, então, ela só quer mesmo é posar de quem tem a solução para o Brasil (mesmo que saiba que é conversa fiada).

2 comentários:

  1. "Complicado, sujeito a manipulações, o voto distrital é ruim na representação de minorias, leva à falta de ideologia na política e enfraquece os partidos"

    Engraçado como ao tentar apresentar defeitos o sr. enumera três grandes qualidades do voto distrital.

    ResponderExcluir
  2. Não vejo tanta graça nisso... de fato, são três grandes qualidades, quado se adota a abordagem xenofóbica.

    ResponderExcluir